domingo, 11 de abril de 2010

CONFISSÕES II

Tenho nas faces a deformidade causada pelo descaso. E essas lágrimas que me confundem em sua constituição: a dor de cada queda me faz crer que sejam de vidro. Produto do abandono são essas linhas que escrevo, em letras miúdas, destoantes daquela normal, como que também abstraídas de sentido e de si. Agora procuro algo que não sei exatamente o que é. Talvez queira transformar essa mágoa que me consome em algo menos tóxico. A dor não passa. Tomada de assalto e mantida sob controle, obrigada a executar procedimentos a despeito da minha vontade. Afronta terrível a uma natureza indomável. Não existo sob ultimatos alheios. A pressão me desintegra, faz de mim bicho acuado, revolto por não ter instrumentos para lutar. Me exponho na esperança de que alguém me veja. Que se enxergue não o que pode ser visto, mas que se olhe além. Grito não para me fazer ouvida, eu não tenho nada a dizer. Só quero que olhos mais atentos observem a essência dessa forma inconsistente. Sem segundas intenções, sem flechas de Cupido. Agora, tudo o que queria era ter a coragem autodestrutiva de Ícaro e, incomunicável como estou, me entregar sem reservas à tragédia. Ao ódio forjado em mim, devolver culpa. Remorso denso e pesado. A constatação do erro tantas vezes anunciado. Eu não quero confissões nem memórias. Quero somente algo definitivo que me livre de uma vez desse mal que me assola todos os dias.
Ultraviolet.

2 comentários: