quinta-feira, 27 de agosto de 2009

DIÁRIO DE UMA ENTORPECIDA

“O amor é mesmo uma cisterna promíscua de desejos impotentes”.
(Alain Bisgodufu)

Minha cabeça gira. Gira junto com tudo em volta, como se na xícara houvesse uma mistura de chocolate, whisky e café, e na mão, algumas balinhas coloridas pra acompanhar. Mas não é nada disso. É paixão, doença, obsessão. É você que falta, me deixando jogada nessa cama a olhar fixamente algum canto, querendo escrever na parede seu nome, preencher toda essa brancura impura com meu melhor batom. Nada adiantaria, pois me embriago com meu cheiro tentando encontrar em mim algum vestígio seu. Você não imagina as peripécias a que me proponho pra amenizar essa falta. Você nem deve ter a noção exata do tanto que é necessário pra mim. Minha loucura tem sentido. E você é a razão e o antídoto. Porque não me aceita de vez na sua vida? Assume que eu sou a melhor parte dos seus dias. Enquanto me reviro mirando o vazio, o lado esquerdo da minha cama, tão seu, como tudo aquilo que descansa sobre o lado direito, você segue em passo falsos, ilusões maiores de um cotidiano insano. A verdade sou eu. A sua paz somos nós. E se resolver omitir-se, espero que não se importe em nos condenar a um mundo cinza, e a crises cada vez mais fortes de abstinência. Vício gostoso tudo aquilo que vem de você. Já não me lembro como eu era antes de te conhecer. Minha alma se dobra em meio a som, fúria, e desejo, e assim vou vivendo, me adaptando aos efeitos colaterais dessa ausência. Mas, se de fato morrer de amor, não dispenso seu cortejo.
Ultraviolet.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Tinha 40 minutos para decidir se ia ou ficava. Os olhos fechavam involuntários enquanto a boca clamava por algum açúcar bonito, talvez num formato triangular, com morangos, cerejas ou qualquer outra coisa vermelha pra adornar seu desejo. Não se decidira ainda. Sentada na sala sem janelas de frente verde, ouvia tudo aquilo que poderia ser útil de algum modo. Informações a conta-gotas, com prazo de validade pré-determinado. Mais uma vez a natureza inquieta agitava-se dentro dela. Não era possível fixar a atenção em um ponto técnico, pois a mente divagava, ia longe nos mais diversos assuntos e fatos, seus devaneios transcendiam os limites do universo. Voltou a si, relembrou a promessa sua e as palavras dele. Vagou por mais algum tempo na voz doce e esta lhe preencheu a ponto de decidir ficar. Tentou cumprir sua própria promessa para que ela se tornasse divina.
Ultraviolet.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

ENTROPIA

Ao seu lado o telefone tocava incessantemente sem que ela pudesse atender. Ela havia quebrado o ciclo habitual das coisas e estava naquela posição incomum sobre o chão cinza daquela cidade escura. A cor de sua boca espalhava-se por todo o seu corpo. Ainda tinha clara em sua mente o som da última sinfonia: o cantar dos pneus. Mas o sentido de tudo aquilo ainda se mostrava ausente, e apesar do vento frio, seu corpo permanecia quente. Guardava também certa umidade vermelha entre os cabelos negros. Multidões desconhecidas ajuntavam-se a sua volta, e ao lado, entre murmúrios e condolências, sinais de cruz e olhos de piedade, ainda podia perceber ao longe o toque insistente, como que presságio da tragédia a alguém anunciada, e de fato, consumada. Vislumbrou pela ultima vez alguns clarões já disformes, algumas copas de árvore, alguma farda a apoiar-lhe a cabeça e prédios maiores e mais longos do que pensava ser. Só não conseguiu saber se os pequenos fragmentos de luz eram estrelas ou reflexos de olhos marejados. Tudo era muito longe, tudo era muito perto. Desprendeu-se das interrogações, respostas e significados, elevou-se entre as nuvens, assistindo do alto o desfecho daquela imprudência. Queria saber o que seria feito daquele corpo inerte, não mais imbuído de emoções. Seria recolhida à história, e tudo que em vida adornada e cuidara, agora tornaria poeira lançada ao vento.
Uv.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

O estranho chegou derrepente e chamou a atenção
O visual diferente, a cara séria e nos cabelos muita informação
O estranho tem amigos, companheiros homônimos
Fala sobre a vida, a hipocrisia e a política
Sempre com muita articulação
O estranho me vê e não se importa
O estranho não nota minha vista torta
O estranho se adequa ao espaço como se fosse intrínseco a ele
O estranho não pertence a lugar nenhum
Não poderia ser contido por quatro paredes
O estranho tem presença que marca
O estranho é como escombros de uma casa abandonada
O estranho tem voz potente, exala arte por entre os dentes
O estranho faz versos pra espoliar a dor
O estranho se entorpece para compor
O estranho conta contos e problemas modernos
Sabe o que atormenta comuns e controversos
Cirrhoses, AIDS, Gripe Suína
Vidros negros nos olhos não escondem opiniões ferinas
O estranho não acredita na verdade dos iluminados
O estranho vende letras no país dos iletrados
O estranho enxerga além do que se pode ver
O estranho é tudo aquilo que eu gostaria de ser
Exímio artista, poeta das coisas da vida
E eu não sei fazer versos, sou apenas contista.

Ultraviolet

Ganhei estes dois selos a algumas semanas, mas por falta de tempo e maiores conhecimentos sobre as configurações do blog, não os postei, mas agora estão ai!!
Agradeço imensamente as indicações, pois realmente não esperava tamanho reconhecimento por meus contos e além disso, os selos vieram de pessoas que eu realmente admiro, pela forma que escrevem em seus blogs. O primeiro selo veio da Nayara Fontenelle (que parece não estar mais entre nós - Nina, cadê seu maravilhoso blog??) e o outro veio de uma pessoa que me inspirou a publicar meus contos, grande honra, fui indicada por Kate Polladsky! Agradeço mais uma vez, e agora vamos as regras...

Como são dois selos com regras muito parecidas, mesclo elementos das duas:

1. Colocar o selo no seu blog.
2. Indicar 5 blogs que você adore.
3. Informar os premiados.
4. Dizer 5 coisas que você adora

Vamos então aos meus indicados:

http://bisgodofu.blogspot.com/
http://trintapalavras.blogspot.com/
http://www.soucontinenteperfeito.blogspot.com/
http://euresguardo.blogspot.com/
http://www.ideologia-silencio.blogspot.com/

5 Coisas que gosto:

Livros
Música
Conversa com amigos
Céu estrelado
Escrever

Então é isso! Obrigada aos que acompanham as palavras de Ultraviolet, bjos!











quinta-feira, 6 de agosto de 2009

A noite verde empestiada por uma esperança morta dá ao tédio ares de eternidade. Percepções disformes do óbvio, irreconhecíveis até então, criam idéias mefistofélicas que trasbordam em palavras vazias – em relação ao som – mas profundas, reais e sólidas. Nada pode ser bom. O desejo não vale nada, não agora, onde a descrença com a humanidade e os modos de vida padrão-popular, com as ideologias padrão-popular, desmoronam criando o perfeito cenário do caos, revelador das belezas escondidas, exóticas e verdadeiras. A contradição grita. Tudo gira em torno de um instinto reprimido. Uma ação inadequada que só toma forma na escuridão dos pensamentos insanos. A constatação da maldade dá um prazer profano quase reprovável – e um leve sorriso nos lábios. A coragem auto-destrutiva de Ícaro aludi a uma vontade interior. É esse o objetivo. Mas será que eu sobreviveria? Não sei. Não importa. Oblitero dúvidas e certezas – apenas reverbero.
Ultraviolet.

sábado, 1 de agosto de 2009

01, 06, 13, 28, 53.

Quando olhou lá embaixo viu a fila de carros se estendendo pelo quarteirão, e por um momento, entreteve-se com aquela aquarela de cores metálicas, distribuídas em formas variadas, tão parecidas na sua essência. Voltou a vida quando ouviu a buzina e se irritou com o palhaço a e a trupe a segui-lo. Se o trânsito está parado, fazer barulho vai mudar alguma coisa? O sinal vermelho é surdo. Mas ela não era, então foi pra dentro e procurou os formulários que teria que preencher: na irritação do caos terrestre, lembrou enfim o que havia de fazer. Então mãos-a-obra: cadeira, mesa, caneta preta, folha semicompleta. Algumas perguntas muito técnicas, pra tentar identificar o que ela realmente era. Aí então surge a grande questão: ela deveria dizer a verdade, ou aquilo que esperavam ouvir? Se deu conta de que não tinha a mínima de idéia de quem eram “eles” e também não poderia dizer o esperado, porque não sabia ao certo como era. Não se via de frente, e aquilo que pensava ser limitava-se à mera ideologia. Guardou os formulários. Achou melhor jogar na loteria.
Ultraviolet.