sábado, 2 de março de 2013

Solidão a dois.



Um dia ela acordou quente numa manhã fria, enrolou-se ao máximo em cobertores macios, desejando alguém pra se enrolar nela também. Não tinha. Estava sozinha na cama pequena. Não desistiu por isso. Continuou ali, a mente criando cenas, temas, dilemas. Pessoas impossíveis, inexistentes, personagens perfeito em seus desfechos. Não era suficiente. Porque ela permanecia quente na manhã fria, não pelos macios cobertores de bichos, mas dentro, interno, desejo pulsante no baixo ventre. Ela estava sozinha. Inusitado era ela ter alguém, mas ainda assim estar sozinha, ainda sim ser vítima do calor que vem de dentro de quem tem urgências. Insatisfeita (para ela). Insaciável (para ele) que sempre andava muito ocupado. Que sempre tinha outras prioridades, que se achava muito garantido pelo amor dela. E ela com tão pouco. Levantou, depois de fantasiar não com quem existe, mas com quem precisou criar (era fácil para ela criar personagens e situações fictícias), ligou, bateu o telefone com força, ficou com raiva, com tanta que resolveu se mover pra dissipar. Limpou o quarto, leu artigos necessários, mudou a cor das unhas. Dormiu mais um pouco. Viu novela e um programa na TV. Tudo pra ocupar, tudo pra espairecer.  Mas as músicas ainda vinham a sua cabeça. E a vontade de dizer “basta!”, ao fim da noite já deu lugar a uma espera. Poderia ele ainda aparecer? Ainda viria? Tomaria conhecimento da sua necessidade? E ela estaria disposta a aceitar? Agora o dilema era sustentar a postura forte ou derreter de vez nos braços de quem era relapso. Ela tinha urgência. Ele nem sequer imaginava. Ainda vagava em universos distantes da realidade do gênero dela. A noite acompanhou a manhã e seguiu fria. Agora, resta a ela se enrolar bem mais nos quentes cobertores macios de bichos, e se conformar em só receber calor deles, e talvez até adicionar mais um, porque agora o frio vem de fora e do seu interior também. Vento e chuva na janela. Gelo se acumulando dentro dela.


Ultraviolet

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