Era um palácio de muitos cristais e luzes e som de sinfonias suaves que brotavam da relva ao redor. Tudo era força e poesia. Era brilho e melodia. A porta ficava como a guardiã da pureza e de toda a beleza desmedida.
Ela vivia lá. E um dia, curiosa como criança em fase prima, como de posse de segredo a ser passado adiante, ela quis ver além do que lhe era revelado. A porta deixava passar imaginação.
Ela com vestido rodado, as meias até os joelhos, o sapato preto delicado deu o primeiro passo. Olhos fixos no objetivo. Mas o pai que a tudo assiste tranqüilo dá o aviso:
_ Quando você sair, não vera mais a porta.
Ela se volta e apenas sorri.
_ Se você sair, não verá mais essa porta.
E ambos olham-se num ímpeto de amor que não pode ser descrito. Os semblantes impassíveis.
Linda garota em flor.
Ela se vira e vai. Atravessa a porta. Caminha firme. Mas quando olha para trás, o palácio já não existe. A porta desapareceu no ar. Ela está sozinha em outra dimensão.
A princípio tudo é excitante. O mundo é desconhecido, o novo causa fascínio. E os passos são decididos. Um campo amplo, aberto, coberto com flores amarelas. E a pequena garota destemida caminha tranqüila pelo campo. O coração palpitante de alegria, mas ainda sente reverberar nos seus ouvidos a voz que docemente dizia:
_ Você não mais verá a porta.
Ao fim de muitos dias, o sol do novo mundo parece cansado. E as cores já não são tão vibrantes. A criação é indiferente a sua passagem. O campo Acaba. A floresta inicia adiante. Ela para. Observa. Decide.
Ela quer. Ela pode. Ela vai.
A linda garota de olhos negros quer conhecer tudo o que ainda não lhe foi mostrado. E o coração palpita novamente. E as delícias do proibido a assaltam como o abraço apertado de Espíritos do Vento. A floresta é convidativa. Tudo está sob controle e ao ensaiar o primeiro passo, surpreende-se com um pensamento íntimo:
_ Você não verá mais a porta.
Atropela a consciência. Já é tarde para voltar atrás. E também não quer negar o orgulho. A garota com vestido rodado, meias até os joelhos, sapato preto delicado e olhos firmes agora é dona de si. Confia no amor inestimável do pai, mas quer saber o significado da liberdade.
O interior da floresta atrai olhares. Ao redor, acima, o chão, é tudo música. E ela segue. Ela dança. E a noite chega soberana. A lua é mãe de todos os sedentos. O mundo gira, roda e ela acompanha. A música é acelerada. E cada vez mais, as guitarras ficam mais pesadas e sutilmente, os violinos vão ficando gradativamente sinistros. Lux Aetherna. Ainda existem risos. Mas o tempo muda, e os sinos anunciam tempestade. A chuva vem pra trazer à tona todas as mágoas.
O caminho fica sombrio. E num piscar de olhos, tudo é misto de som e fúria. E a garota corre. Corre buscando uma saída. E subitamente a floresta termina. Ela está num pântano. Afunda os tornozelos na lama. Tenta dar jeito como pode. Limpa-se da melhor maneira que consegue. E pula os galhos e anda torto e dribla o cansaço. De todas as direções, de todos os cantos de sua alma, ouve muitas vozes, diferentes timbres, diferentes sons, mesma mensagem, todas sobrepostas:
_Porta, porta, a porta, você não verá mais a porta, volta, porta, corta, lembra, porta.
Tentou ignorar. Mas o corpo doía. Sentou num lugar seco, encostou numa árvore, fechou os olhos. Pela primeira vez sentiu-se sozinha.
********************CONTINUA********************
Ultraviolet.
Linda narrativa, de contornos oníricos, subjetivos, e que nos faz viajar de inicio a uma velocidade leve, contemplativa, depois a um galope desenfreado. uma combinação perfeita da sua escrita poética com uma linha narrativa. Vou ficar esperando a continuação. ^^
ResponderExcluirThis is my girl...
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